Mal acostumados?

Muitas vezes ouvimos a frase: “ah se fosse em outro país!” Essa expressão é comumente dita quando alguém se sente “injustiçado” ou quando acha que teve algum direito ferido em nosso país. Já há algum tempo tinha esse tema em mente para meu artigo do mês, porém, agora, ao voltar de mais uma viagem ao exterior o que tenho bem fresco na cabeça é que “graças a Deus estamos num país onde os direitos são respeitados”.

O Brasil pode não ser, aos olhos de muitos, um exemplo, mas com certeza temos um ordenamento jurídico, se não perfeito, muito bom. O que às vezes falta é o regular cumprimento da lei ou uma fiscalização mais efetiva.

Há algum tempo em viagem à Argentina, tivemos um dos primeiros sinais dessa conclusão com que comecei nosso artigo. Viajava num táxi, num dia de chuva torrencial quando, de repente, o motorista simplesmente acendeu um cigarro, com todos os vidros fechados em virtude da chuva e o fumou tranquilamente. Após o espanto inicial não tivemos a chance nem de reclamar, pois a cara dele já dizia tudo. Se reclamássemos com certeza a opção seria descer do veículo e tomar aquela chuva imensa.

Ano passado, em outra viagem, ao Chile, o desrespeito foi ainda maior. Em relação aos táxis, o que vimos é que o consumidor é enganado por todos os lados. Pensei comigo num determinado momento: “antes fosse um simples cigarro”. Os taxistas de lá, em mais de 50% das oportunidades em que usamos seus serviços, tinham seus “macetes” para aumentar as corridas em muitos e muitos pesos. Percebemos isso após pegarmos, por duas únicas vezes, veículos dirigidos por profissionais sérios, e percebermos o absurdo que os demais cobravam. Depois disso, analisando vimos nos demais que a cada troca de marcha o taxímetro disparava, chegando ao ponto de descer no primeiro quarteirão em certa ocasião. Ainda nesse país, numa grande rede de lojas de departamentos, fomos comprar um produto em promoção. Ao chegarmos ao caixa o valor cobrado era muito maior do que constava na etiqueta. Ao questionarmos a atendente disse simplesmente que a promoção havia acabado, questionamos e ela com um sorriso nos lábios simplesmente disse “quer levar ou não?”, diante da negativa jogou o produto num cesto e chamou o próximo da fila. Ah se fosse no Brasil!

Agora, nesse último mês, em nova viagem, à Europa, percebemos que o respeito ao consumidor também não é levado em consideração. Lá o que vemos é um respeito muito grande à legislação trabalhista, onde os trabalhadores exigem seus direitos com greves, movimentos e manifestações, em especial na França. Mas o direito do consumidor é relegado a segundo plano. Na Itália, por exemplo, mais algumas situações nos mostraram isso claramente. Em uma delas, ao sentarmos num restaurante que fecharia uma hora mais tarde, praticamente fomos convidados a não ficar. Ficamos! E o atendimento foi péssimo. Em outro restaurante a enganação foi ainda maior. Num “self service” fomos informados que o valor do prato era X, porém ao chegar ao caixa, depois de toda a “cortesia” dos atendentes o valor foi 3X. Ora, o valor era um para o prato quente, outra para a salada e outro para o acompanhamento. Um senhor do Rio Grande do Norte que estava na mesa ao nosso lado ainda disse: “quando vir um italiano muito gentil e engraçado, desconfie, porque aí tem.”. Ele comia seu prato já sem vontade, mas com força pelo valor pago. Por fim, ainda lá, em evento na Vaticano, evento esse comprado com mais de dois meses de antecedência, não conseguimos sentar nos lugares marcados, ao questionarmos o policial fomos informados: “aqui é a Itália, ingresso não serve, tem de chegar cedo. Oras, compramos um ingresso, com hora marcada, chegamos com mais de uma hora de antecedência para não ter problemas, só podemos mais uma vez pensar, “ah se fosse no Brasil!”

Por outro lado, temos um país que chega a ser o extremo do cumprimento de tudo, que são os Estados Unidos, pelo menos em oportunidades em que estivemos por lá pudemos perceber que o cidadão é sim muito respeitado. Seja como consumidor, seja como turista, seja como pessoa. Mas é um caso à parte. Por isso, voltei de viagem com a certeza de que somos muito mal acostumados e, em certos momentos, mal agradecidos com nosso país. Ah se fosse no Brasil!

José Antonio F. Antiório Filho é Advogado com MBA em Gestão Empresarial.

*Artigo publicado na Revista Vertical News

Edição nº 35 – 06/2016